terça-feira, 4 de maio de 2010

A primeira e última carta

Sentava-se sempre na mesma mesa, a mesma hora naquele velho café. O pedido era variado, ou um café, ou um copo de água, ou nos dias em que ele parecia mais bem disposto, uma cerveja ou um martini.
Acompanhava-lhe sempre aquela guitarra que nunca saiu do saco, mas pelo estado do mesmo, deveria ser velha com muitas cantigas choradas. Sempre com um bloco e uma caneta, ele escrevia ou desenhava, assim passava ele horas naquela mesa. Eu apreciava-o, mas sinto que ele nunca se apercebeu, porém assisti um dia a uma situação que me deixou curioso. Uma rapariga, da mesma idade, sentou-se ao lado dele e observou-o atentamente. Ele murmurou algo, ela meteu a mão a cara e depois de chorar, escreveu algo num papel dela. Ele friamente não olhou para ela e não respondeu as lágrimas. Ela levantou-se e saiu dali a correr. Demorou uns segundos ate ele ter coragem em ler o papel dela.
Eu não consegui tirar os olhos daquele episódio surreal. É então que acontece o que nunca imaginaria ver a acontecer: Ele começa a chorar, e logo após de uns minutos, tirou a guitarra e tocou a mais bela musica, de amor, de tristeza, de lágrimas jorradas.
Tudo se petrificou a olhar aquele episódio, algo que ninguém estava a espera de ver e ouvir. Depois de um instante, sai do café e deixa a carta ao abandono.
Eu esperei, mas ele não voltou e a curiosidade era muita e então li a carta deixada.

Dizia:

" Vivi nas sombras durante uma eternidade, onde não via a luz, onde não tinha sonhos, onde se eu dormisse, pois era impossível, eu tinha pesadelos de momentos que nunca vivi.
Passei pelo inferno e la me instalei, procurei encontrar caminhos, no entanto parava sempre no mesmo canto. É então que no meio da turbulência surgiu o teu olhar, o teu rosto, que tornou dia o que pensava a acreditava ser noite. O teu abraço, encheu de calor o corpo que há muito ja era frio, onde há muito já era Inverno. Sentir o teu corpo fez com que eu te deseja-se cada vez mais, e sentir-me desejada era um vicio. Possuis te me naquele local, naquele fim de tudo, onde fui feliz só dessa vez, no entanto procurei-te na noite seguinte, no dia seguinte, na semana seguinte e nunca mais, nunca mais surgis te, e as trevas tomavam conta do caminho que crias te.
No desespero, corri, fugi daquele lugar, para ti e quando consegui sair, estava num local vazio, branco, sem nada, sem som, sem luz e a sombra que eu tinha e que me sempre acompanhou, desapareceu e ai percebi que me abandonas te.
Corri, sem destino e vi-te, sentado no mesmo sitio de sempre e perguntei-te "O que sou para ti?" e tu respondes-te:"

E o texto aqui tinha outra cor, notou-se que foi escrito no momento, a resposta dele a pergunta que ela fez a ele naquela tarde.

A resposta foi:

"Eu não te conheço, desaparece da minha vista e não voltes."

Sem comentários:

Enviar um comentário