quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Café Orquídea II

Se os dias eram chuvosos e frios, as noites eram de tempestades. Ventos ciclónicos que faziam de tudo para entrar pelas janelas dos quartos, a chuva que incansavelmente tentava invadir as habitações e os relâmpagos que tiravam o sono as crianças deixando as a chorar, pedinchando alguns para ir para a cama dos seus pais para se sentirem mais seguros, medo de que no seu pequeno quarto a tempestade pudesse entrar. Era um bocado igual em todas as casas nessa noite, excepto numa. Já ao pé daquela majestosa montanha, havia uma pequena habitação onde reinava a calma e o sossego, uma casa que parecia que não tremia com a tempestade, onde o vento não parecia que tivesse necessidade de entrar, uma casa onde quem habita esta em paz. Uma eterna viajante, que seguia um caminho simples entre estrelas e planetas distantes, no entanto com os pés bem assentes num bocado de areia. Dessa maneira deixou-se a olhar para o horizonte, um horizonte vazio, onde a cada momento que se passasse surgia mais areia e mais areia até se formarem duas pirâmides de areia no fundo do horizonte.
                Sem se mexer, ficou a olhar atentamente para o horizonte e num mero segundo, fechou os olhos e respirou bem fundo, enchendo bem os seus pulmões. Enquanto deixava sair o ar pesado que tinha acabado de respirar abriu os olhos. A sua visão deixou-a atrofiada e insegura pois assim que abriu os olhos encontrou a sua frente dois cavalos. Notava se perfeitamente que seriam irmãos no entanto havia algo curioso. O cavalo do lado esquerdo era negro, completamente preto, o seu pêlo era brilhante e linear, conseguia-se ver bem a brisa desértica a passar por ele. Majestoso e forte com um brilho inconfundível no seu olhar, parecia o reflexo do universo que estava sobre as suas cabeças. Ao lado deste, estava o seu irmão, no entanto este outro cavalo ardia em chamas. Era uma criatura intimidante e nervosa, não parava de bater com os cascos na areia deixando uma pequena área de areia queimada, uma sombra de cinzas. Era majestoso também mas assustava pelo facto de estar completamente consumido em chamas e continuar ali vivo. Sem dar um passo em frente e completamente ofuscada pelos cavalos, ficou ali admira-los mais um bocado, até que as duas criaturas se moveram e se afastaram um pouco uma da outra e de repente surge perto de cada um dos cavalos um cubo. Dois cubos estavam agora a frente dela, mas eram muito diferentes. O cubo que estava ao lado do cavalo negro e belo era relativamente pequeno, pouco maior que ela e estava ali a flutuar. Sólido mas leve, feito talvez de carvão. Ao lado do outro, perto do cavalo em chamas, estava um cubo enorme, em comparação com o outro cubo. Este era transparente, obviamente vidro e também a flutuar, este flutuava em seu próprio eixo. A visão era estranha mas harmoniosa e ela sentia-se cada vez mais insegura a tudo o que a rodeava, sabia que era bonito mas sentia que algo de mau estaria próximo. Nisto e sem avisar de onde, surge no meio desta linda tela, uma escada. Um simples escada de madeira mas havia algo estranho nela: ela surgia de um buraco no deserto e seguia em direcção as constelações. Ela chegou-se para perto da escada, sentindo-se observada pelas duas criaturas e olhou para o buraco. Não conseguia ver onde a escada estaria pousada e em ansiedade olhou para as estrelas. Entrou num súbito pânico e apercebeu-se que também não conseguia ver até onde chegava a escada. Olhou em seu redor e de repente, entre as duas pirâmides, surgiu uma tempestade de areia, que de uma maneira surreal aproximava-se cada vez mais depressa dela. Em pânico ela olhou a sua volta e para seu espanto nada se tinha movido: os cavalos continuavam no mesmo sítio a olhar para ela fixamente. Os cubos continuavam a flutuar calmamente e a escada não tremia de maneira nenhuma. A tempestade cada vez mais se aproximava e ela tentou gritar em desespero mas nenhum som saiu, nada, apenas o barulho da tempestade de areia cada vez mais próxima se ouvia e foi então que em lágrimas, se ajoelhou e a tempestade a engoliu. Um relâmpago tremeu com a casa toda e do meio da escuridão daquele quarto, em sobressalto, alguém se senta e completamente suada fica a olhar em pânico para a janela. Com o batimento cardíaco louco de um atleta e com a respiração completamente ofegante ela diz:
                - Outra vez este pesadelo?! – Enquanto o diz tenta manter a sua respiração calma e põem-se a pé da cama e vai em direcção ao quarto de banho. Abriu uma pequena gaveta e tirou de lá um pequeno recipiente com uma medicação e tomou dois comprimidos sem hesitar, bebeu um copo de água de um só trago e voltou-se a deitar. Respirou fundo e foi uma questão de segundos a acalmar e sem que ela se desse conta, naquele momento, como por magia, um manto celestial pousou sobre os seus ombros, ela sentiu-o e sorrindo tentou abraça-lo mesmo sabendo que nada físico estaria ali, no entanto ela fechando os olhos disse:
                - Eu sabia que ainda me vinhas abraçar antes de eu me deitar, meu anjo da guarda. – e assim adormeceu.
                Seriam pelo menos nove da manhã quando ela saiu de casa e a tempestade já não era tempestade, no entanto, a chuva continuava a cair. Entrou no seu carro e foi até a cidade. Estacionou o carro e abriu o seu guarda-chuva vermelho, e dirigiu-se a florista, a dona Luísa. Ela ia distraída no pensamento sobre o pesadelo da noite anterior e o que poderia significar tudo aquilo que nem se apercebeu que já estava debaixo do pequeno quiosque quando fechou o guarda-chuva. Ao lado dela estava um jovem que ela rapidamente olhou de cima a baixo, o pobre coitado estava todo molhado e estava a ver o estado dos seus cadernos na bolsa. Virando-se então para a dona Luísa cumprimentou-a com um sorriso e disse:
- Bom dia dona Luísa, mas que tempo para vender flores.
- Bom dia menina, não me diga nada, ninguém quer andar com flores e com o guarda-chuva na mão. E então o que vai desejar hoje menina?
E então ela começou a olhar a sua volta a olhou para o jovem que ficou completamente hipnotizado a olhar para ela. Ela não conseguiu segurar o sorriso e corou um pouco e sem saber exactamente porque voltou a olhar para a dona Luísa dizendo:
 - O costume, mas hoje, sinto que têm de ser brancas dona. – e suspirando enquanto ainda se lembrava da cara do jovem foi a mala tirar a carteira para pagar.
- Umas orquídeas brancas então. Você realmente adora estas flores, dê-me só uns cinco minutos para preparar o ramo.
                - Não é necessário dona, acredite, não me posso demorar. – e dizendo isto entregou o dinheiro a florista e sem que tivessem passado os cinco minutos, já o ramo estava pronto. Deu-se a troca entre as duas senhoras e o troco estava confirmado e já na carteira.
                - Obrigado dona Luísa, até amanhã então.
                - Até amanhã menina e não se esqueça do guarda-chuva.
- Não me esquecia dele num dia destes. – e então pegou no guarda-chuva e sem mais demoras, sem sequer olhar para trás, saiu do quiosque e seguiu pela pequena ruela que havia em frente. O movimento na rua ainda era algum, mas em menos de cinco minutos chegou ao Orquídea, café que ela própria explorava e deixando as orquídeas num pequeno jarro no balcão, foi ao vestuário mudar de roupa, nisto ouviu alguém a chegar e pensou “Já?! Bem, é melhor começar já a trabalhar e assim também me distraio do pesadelo. No entanto aquele jovem até me meteu pena” e enquanto pensava nisto dirigiu-se a mesa e ficou estática antes de falar, quem acabara de chegar era o jovem que estava na florista ainda agora. Sorrindo chegou-se mais perto da mesa e com toda a coragem do mundo disse:
- Bem-vindo ao Orquídea, estou a ver que a dona Luísa lhe disse onde eu trabalhava. - em cima da mesa estava uma orquídea branca igualzinha as que ela tinha comprado. O rapaz lentamente virou-se para ela e a visão era no mínimo engraçada: O pobre rapaz estava encharcado dos pés até a cabeça e o cabelo ainda pingava para a mesa restos da chuva. Imediatamente ela diz:
-Talvez uma toalha e um café para começar. Eu volto já. – e virou-se em direcção ao balcão enquanto pensava “Ele trouxe a orquídea? Será isto um sinal?” e do nada ouviu a voz do rapaz dizendo:
- Desculpe, mas como é que se chama? – Seria possível ele ter perguntado isso? Não era possível, no entanto sorrindo cada vez mais e corada ela voltou-se para ele e com os olhos fechados respondeu:

- Sou Catarina, Catarina Vanessa mas podes tratar-me por Katness se assim o desejares.

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